Publicado em: 1 de março de 2021 Atualizado:: março 1, 2021
Em rota de colisão com o Congresso Nacional devido às articulações de deputados para aprovar a “PEC da Blindagem” e limitar a atuação do Judiciário, o Supremo Tribunal Federal (STF) retoma nesta terça-feira (2) o julgamento de recurso que pode destravar as investigações contra o presidente da Câmara, Arthur Lira (Progressistas-AL). O caso diz respeito ao inquérito conhecido como “quadrilhão do PP”, no qual Lira foi denunciado por organização criminosa.
O julgamento, que será feito na Segunda Turma (composta por cinco dos 11 ministros do STF), pode trazer reflexos na possibilidade de Arthur Lira assumir interinamente a Presidência da República, caso o presidente Jair Bolsonaro e o vice-presidente Hamilton Mourão se ausentem do território nacional.
O presidente da Câmara é o segundo na linha sucessória da Presidência da República. Um precedente do Supremo estabeleceu que réus em ações penais podem até comandar uma das Casas do Congresso, mas não substituir o presidente e o vice, caso os dois se ausentem do País.
Tanto a Primeira quanto a Segunda Turma do STF já aceitaram denúncias contra Lira em dois inquéritos distintos que ainda aguardam a análise de recursos. Na prática, dois pedidos de vista (mais tempo de análise) dos ministros Dias Toffoli e Gilmar Mendes travaram o prosseguimento dos casos e a abertura de uma ação penal para aprofundar as investigações.
Se o recurso de Lira for negado nesta terça-feira, uma ação penal será aberta e o presidente da Câmara será efetivamente considerado um réu perante a Suprema Corte. A defesa do parlamentar, no entanto, aposta em uma mudança na legislação – com a aprovação do pacote anticrime – para que o recurso seja acolhido e a denúncia acabe arquivada.
A nova legislação, sancionada por Bolsonaro, proíbe o recebimento de denúncia exclusivamente com fundamento nas declarações do delator. Na avaliação da defesa de Lira, as acusações contra o presidente da Câmara foram baseadas na palavra do doleiro Alberto Youssef, pivô da Operação Lava Jato.
“Essa denúncia, pelo menos em relação ao Arthur Lira, foi feita com base na palavra do delator, o Alberto Youssef, que é inimigo notório do presidente da Câmara. Como mudou a lei, e a lei diz que não pode mais receber denúncia só com base na palavra do delator, entendemos que este é um argumento muito forte para que a decisão seja revista”, disse o advogado Pierpaolo Bottini, que defende Lira no caso.
Placar apertado. Em junho de 2019, a denúncia contra Lira por organização criminosa no “quadrilhão do PP” foi recebida pela Segunda Turma do STF por um placar apertado: 3 a 2. Naquela época, Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski – dois expoentes da ala do Supremo contrária à Operação Lava Jato – votaram contra o recebimento da denúncia. “Uma coisa é fazer paredes. Outra coisa é amontoar tijolos. Isso aqui é amontoar tijolos. Não se pode simplesmente fazer uma acusação de organização criminosa em abstrato”, criticou Gilmar Mendes à época.
Já o relator da Operação Lava Jato no STF, Edson Fachin, e a ministra Cármen Lúcia defenderam a abertura da ação penal contra Lira e aliados. Coube ao então decano do STF, Celso de Mello, dar o voto que definiu o placar e determinou o recebimento da denúncia.
Com a aposentadoria de Celso de Mello, o recurso de Lira será julgado por uma nova composição da Segunda Turma, que passou a ser formada pelo ministro Kassio Nunes Marques. Desde que assumiu uma cadeira na Corte, em novembro, o ministro tem imposto derrotas à Lava Jato, se alinhado a Gilmar e Lewandowski e votado conforme os interesses do Palácio do Planalto. Lira é aliado de Bolsonaro, que mobilizou a máquina do governo para garantir sua eleição na Câmara. Durante a campanha o Palácio do Planalto abriu o cofre e destinou R$ 3 bilhões para 250 deputados e 35 senadores aplicarem em obras em seus redutos eleitorais. O governo também distribuiu cargos para aliados.
Em maio de 2020, Gilmar pediu vista no julgamento, após Fachin votar pela rejeição do recurso de Lira. Até agora só o relator da Lava Jato se manifestou sobre o “embargo de declaração” do presidente da Câmara.
Além de Lira, também são alvo da investigação os deputados Aguinaldo Ribeiro (Progressistas-PB) e Eduardo da Fonte (Progressistas-PE) e o senador Ciro Nogueira (Progressistas-PI). Ciro Nogueira deu a bênção para a indicação de Nunes Marques ao STF.
Estadão Conteúdo
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